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Автор книги: Marcos Sassungo


Жанр: Современная зарубежная литература, Современная проза


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De repente, as lembranças das minhas vivências foram interrompidas.

– Amor, amor, acorda. Por favor, desculpa acontece que são horas e precisamos de ir ao shopping.

– Está bem, mas que horas são agora?

– São quatro e trinta e dois minutos da tarde.

– A sério, querida?! O tempo passou correndo e não percebi. Olha, amor, esqueci-me de te dizer, infelizmente, não vou poder ir contigo e com a Deisy ao shopping. Levem o Batinho convosco.

– Mas, amor, o meu carro está na oficina e se tu vais sair, provavelmente, vais de carro. – Disse a dona Esmeralda.

– Não, querida, podes levar o meu carro. Eu vou chamar um táxi. Eu tenho um jantar com um amigo meu e cliente importante da empresa. Foi meu colega, enquanto estudávamos na Rússia. Acho que te lembras do Nico, não? Aquele cara meio clarinho e de barba assustadora…

– Hammm, okay, eu lembro-me, sim. Está bem, amor. Agora tens de conversar com a tua filha, porque não sei, não. Eu não quero justificar a tua ausência por conta dos teus negócios. Tu sabes como ela é.

– Está bem, amor, eu vou falar com a Daisy, sim. Agora me dá um beijo, que estou apressado.

Naquele dia, eu percebi no semblante da minha esposa o deserto da minha presença na vida da minha filha. Eu prometera a ela que mudaria com o nascimento dela, mas infelizmente os negócios começaram a mudar e as estratégias da minha empresa também. Eu não podia fazer nada. Acontece que a concorrência era demais e eu tinha de fazer face aos mesmos. A regra dos 4 Ps do Markteing já não estava a funcionar.

O Sr. Rafael beijou a Esmeralda, sua esposa, e despediu-se da pequena Daisy.

– Amor, sabes de que o papai te ama, não sabes?

– Sei, sim. – Respondeu Daisy.

– Olha, papai tem que ir agora para o trabalho. Um amigo está a chegar e eu preciso de estar com ele. Tu vais ao shopping com a mamã e o Batinho, teu irmão. Está bem?

– Sim, papá, está bem.

– Dá-me um beijo, filha. Eu amo-te.

– Eu também te amo, pai. Vá com Deus.

– Obrigado, filha.

O Sr. Rafael saiu apressadamente ao encontro do Nico, amigo e um investidor importante para Rafael company. Nico era cristão católico, graduado em Engenharia de Petróleo e Gestão Empresarial, um sócio importante da Time Oil Company. Sua visão em relação à vida, à religião e à ética social, mudara durante a sua estadia na Rússia. E quando voltou para África, os seus dogmas mudaram irreversivelmente pelo menos até àquela época.

E foi assim que o Sr. Rafael encontrou no restaurante, o Nico, seu antigo colega e amigo. – Nico, há quanto tempo, campeão.


– Сколько лет сколько зим, amigão. Estás vivo, ainda? Perguntou Nico entusiasticamente.

– Uuu, graças a Deus, ainda vivo a viver. E tu, como estás?

– Estou tranquilo. E a Esmeralda, como está?

– Ela está bem, graças a Deus e manda lembranças.

– Obrigado, compadre. Estou aqui, mas ainda não pedi nada do que vais querer?

– Um café e uma água para começar. – Disse o Sr. Rafael.

– Tu continuas vegetariano?

– Sim, Nico, ser vegetariano é um estilo de vida e eu escolhi ser.

– Rafael, quem diria que nos encontraríamos depois de muito tempo. Eu inclusive cheguei a pensar que você ficou com a colega, aquela jovem de preto. Esqueci-me como ela se chama.

– Anastácia. Nós tínhamos objectivos diferentes. Ela não é russa, é uma ucraniana, mas ela amava viver na Rússia. Eu não sei onde ela anda ultimamente e queira Deus que esteja bem. Mas me fale de ti. Casaste-te, tens família ou nem por isso?

– Eu, Rafael? Casar-me?! Eu não quero juntar-me a esse time, não ainda. Eu tenho as minhas admiradoras e gosto de estar com elas, mas nada de casar e ter família.

–És um homem de sucesso nos negócios. Rico, inteligente e isso atrairia qualquer mulher e tu estás a ficar velho e, em pouco tempo, perdes a data de validade, cara.

– Mas não a data de fabricação. Respondeu o Nico, sorrindo ironicamente.

– Eu entendo, mas poderás entender, mais tarde. Porque estás sempre com as teenagers e nunca com mulheres mais adultas que provavelmente estariam contigo por amor. E essas teenagers só vão querer o que tens e não o que és.

– Talvez sim, talvez não. Estou consciente daquilo que as mulheres querem. Uma mulher na minha idade estaria comigo também por algum interesse, não importa o que seja. Mas por uma questão de escolha, eu prefiro uma teenager.

– Nico, Nico, vamos aos negócios, sócio. – Disse o Sr. Rafel.

– Isso sim, é importante. – Disse o Nico e acrescentou: – A TimeOil Company está numa fase economicamente perfeita. Trabalhamos em vários projectos que renderam bilhões para a empresa e para os empresários que incorporam a compania. Estivemos no ano passado na vanguarda do projecto FPSO TEST da Chevron, na Nigéria. E nesse momento, a empresa tem um novo projecto em Angola e está aberta para novos investidores, para novas acções e para novos sócios que queiram investir no projecto. O projecto pertence a compania, logo tu serás um dos sócios importantes da TimeOil Company, isso se concordares com a proposta. Aqui estão os documentos que descrevem tudo sobre o projecto e benefício do Sócio da Time.

– Parece-me uma boa proposta e eu amo desafios. A minha empresa está numa fase de terapia financeira e eu vou levar comigo essa proposta e discutirei o caso com a minha esposa e com os meus sócios. E terei a liberdade de o ler, minuciosamente. Amanhã, poderei dizer-te alguma coisa.

– Eu acho bom. Disse o Nico e acrescentou: estarei, este final de semana, aqui na cidade. A minha viagem está marcada para segunda-feira logo, temos muito tempo para discutir sobre este assunto. Agora, estou com fome, vou pedir algo da terra. Alguma coisa diferente.

– Que tal um calulú para matar a saudade? – Perguntou o Sr. Rafael.


– Aqui vendem?! Mas esse é um restaurante português. Eu conheço o dono desse lugar, é um cidadão da tuga.

– Eles servem comida da terra também. Deixe-me cá ver no menu.

– Aaa, sim, há. – Disse o Nico. Eu vou aceitar a tua sugestão. Funge com kalulú.

O Nico e o Sr. Rafael jantaram-se e os dois saíram para visitar um amigo que estava doente no hospital.

Por outro lado, Marquitos e o Tino decidiram procurar pelo Batinho, naquela noite. Era uma noite de luar cheio de glamour. Os três foram à Rua Nova e lá encontram o Puto Som, o dos Versos, o Mussungo, o Nguito e o Terras.

Todos estavam a conversar, a rir das parvoíces de Mussungo. O tipo era bom de humor e tudo o que fazia e falava punha toda gente a rir. Inclusive, contou o humor de Fernando Rocha, o Hitler, e a piada do Chefe e o Cabolas de Calado Show. Tudo estava indo muito bem naquele momento e o Pedro chegou, cumprimentou todos e disse ao Batinho que naquele dia estava com Carla.

– Batinho, eu preciso de te dizer uma coisa, brother. – Disse o Pedro e acrescentou: eu preciso de te contar um facto que aconteceu hoje e como amigo preciso de te contar, porque do contrário não me perdoaria.

– Diz logo, camarada, porque tanto suspense!

– É sobre a Carla.

– E o que a minha Carlinha tem? Perguntou Batinho. – Eu hoje estava a vir de volta da faculdade e ela ligou-me e disse que precisava de uma boleia para casa e como eu já estava a sair da faculdade, assegurei-lhe que a levaria. E aí ela disse que não queria ir para a casa tão cedo assim e, sugeriu que déssemos um passeio. E aí fomos à Chianga. Além do mais, ela disse que queria espairecer um pouco e precisava de um lugar mais calmo. E eu levei-a. E ela contou-me os momentos difíceis que estava a viver com a sua família e com ela mesma. E cara, eu só sei que a abracei e disse que tudo iria ficar bem. Mas aí, eu perdi a cabeça e beijei-a. E cara, desculpa dizer isso, meu, mas a gente transou no carro.

– Eu não acredito, Pedro, diz-me que é mentira. Tu és meu amigo. Como foste capaz de ligar para ela.

– O quê? – Perguntou Pedro.

– Só há uma maneira de saber. Liga para ela agora, finge que eu não estou do teu lado, cara.

– Tens a certeza de queres mesmo ouvir o que não podes ouvir?

– É o único jeito de ter a certeza de que o que me estás a dizer é verdade. Cara, liga para ela agora.

– Está bem, vou ligar e fica calmo. – Disse o Pedro com um ar medonho.

– Aló, querida, como estás?

– Oi amor, estou a sentir-me melhor. – Disse a Carla. – E o Batinho, já ligou?

– Ele ligou-me, mas enviei uma mensagem a dizer que lhe ligaria de volta. E tu, como estás?

– Eu também estou bem, meu bem.

– E quando é que a gente vai novamente? Eu gostei e quero repetir. – Disse a Carla.

– Está bem. Esse final de semana, vemos um tempo tá bom?

– Está bem, meu amor.

– Tchau, querida cuida-te.

– Está bem, tu também.

– Gostaste de ouvir, agora?

Quando ele terminou, num momento de raiva, Batinho levantou com muita força o Pedro a fim de o derrubar no chão. Mas ambos acabaram por cair. E Batinho encheu de pancadas a cara do Pedro pelo desrespeito moral e ético e pelos danos morais que ele havia causado. Entretanto, toda a discussão estava a desenrolar-se junto da casa do Pedro, de modo que as irmãs do Pedro, ao perceberem o ocorrido, foram apressadamente socorrer. Outros elementos do grupo sabiam que Batinho, apesar de tudo, era um rapaz de génio difícil e não gostava de quando alguém se impunha em suas discussões. E esta era uma das quais ele não queria que alguém se intrometesse, apesar de serem todos amigos. Afinal de contas, era um acerto de contas entre dois amigos que decidiram colidir as emoções. Enquanto Batinho espancava Pedro, uma das irmãs de Pedro chegou e deu um tapa forte no Batinho, de modo que ele largou e deu um pontapé forte na moça e ela caiu. Batinho, não sabendo de nada, simplesmente saiu daquele lugar e foi para casa apressadamente. Ao chegar à casa, ele não conseguiu dormir, a consciência pensando em tudo o que havia acontecido, naquela noite. E quando ele decidiu o fazer, seus amigos o alertaram da chegada da mãe de Pedro e de outros membros da família. Batinho ainda mais preocupado com o que poderia acontecer, saiu apressadamente para fora a fim de fugir de casa e do bairro. Porém, os seus passos se cruzaram com os da mãe de Pedro. A senhora pegou Batinho, encheu-lhe de pancadas, Batinho estava a procurar uma maneira de justificar a dor de uma terrível traição.

– A minha filha perdeu os sentidos e está doente, porque tu bateste nela. Vamos agora ver como ela está. Talvez isso reavive a tua consciência e o resultado das tuas acções. – Disse a mãe de Pedro.

Batinho, com medo, seguiu a senhora, mãe de Pedro e já era demasiadamente tarde. Os pais de Batinho já estavam a descansar. Por isso, não podiam ouvir nada. Pelo caminho, a notícia espalhou-se e uma multidão invadiu a estrada onde a Sra., mãe de Pedro e Batinho, haviam de passar. Os amigos e outros invadiram de confusão a mãe de Pedro e outros membros da família que lá estavam presentes. Todos se espancaram e a situação ficou ainda mais agravada. Pela manhã cedo, a mãe do Pedro chegou com um mandato de prisão para Batinho, pois ele é o autor de toda aquela confusão. Quando a mãe de Pedro soube de que Batinho era filho do Sr. Rafael, cancelou o mandato e disse que não sabia de quem era o Batinho. Mas o Sr. Rafael ficou muito indignado com tudo o que lhe havia sido contado.

– Mereces ir para a cadeia, filho. O que fizeste não se justifica. A briga nunca é caminho para resolver problemas. Devias ter confiado nele, embora ele tenha feito tal coisa. A coragem que ele teve de te contar demonstra amizade.

– Mas pai, ele é meu amigo e não devia ter feito isso comigo.

O Sr. Rafael e a dona Esmeralda pediram desculpas pelo sucedido e asseguraram que pagariam pelos danos físicos, mas não pelos danos morais causados. A Sra. mãe de Pedro disse que aquela era a primara vez e que se sucedesse a outra vez, tal acontecimento levaria Batinho para cadeia. Mas, por respeito da família Rafael, ela perdoou e foi embora, ela e outros membros da família.

– Filho, vamos dar uma volta. Vamos caminhar na estufa. – Dissse o Sr. Rafael ao Batinho.

– Está bem, pai, eu vou preparar-me.

– Vá lá, apressa-te, porque mais tarde vamos pegar o tio Nico, ele vai jantar aqui connosco.

– Oh! – Gritou alegremente a Daisy, que bom que o tio Nico vem a casa.

O Sr. Rafael pegou no carro e saiu com Batinho. Andaram pelo parque da estufa da cidade do Huambo e ambos se sentaram sobre um murro que dava à vista para a cidade baixa. De longe, podia ver-se o mercado provincial da cidade baixa e outros edifícios que lembravam a guerra, naquela antiga Nova Lisboa.

– Filho.

– Pai. – Respondeu Batinho.

– Quais são as expectativas da tua vida? Olha que eu quero contar-te uma experiência. – Disse o Sr. Rafael e prosseguiu: – Um dia desses quando eu era criança, numa quinta-feira, de manhã, peguei na minha mochila e fui para a escola. Mas antes disso, eu tive uma conversa longa com o meu pai e ele não conseguiu entender e, claro, não conseguiria mesmo, porque se conseguisse provavelmente a vida dele perderia o sentido de um tamborim vazio de vida. Ele disse-me que eu não tinha ambição alguma, nesta vida e olhando para ele, o contrariei-o, dizendo que tinha. E disse-lhe que a minha ambição era tão grande e muito maior que dinheiro, confortos e posições sociais. Pai, eu quero mais. Eu disse isso ao seu avô. – O que você quer afinal de contas, nesse claustro universal? – Perguntou ele. Porém, sabes de qual foi a minha resposta, filho?

– Não, pai. – Respondeu Batinho.

– Eu quero tudo o que eu poder levar comigo. Quem sou eu, onde estou e para aonde vou. Eu queria, realmente, saber da grande questão da vida. Porque que estou aqui, para onde vou e para que serve a minha vida, pois não é possível que nós nascemos simplesmente para sermos ricos e termos bens materiais.

O Sr. Rafael abraçou Batinho e calmamente disse-lhe: – Filho, olha para cá. Se o objectivo da vida fosse simplesmente o de ser rico e ter património, logo os ricos não morreriam. Se o objectivo da vida fosse simplesmente estudar e vencer, e vencer na vida, então Einstein, Steve Jobs, Michael Jackson, Valentin Amões e tantos outros vencedores da vida não morreriam. É que se nós nascemos simplesmente para estudar, vencer, ter fama e dinheiro, então somos os mais miseráveis e doentes de uma malária social que corrói os glóbulos brancos da nossa consciência moral e cívica e a vida não faria sentido coisa alguma. Eu não posso acreditar que eu nasci para ser famoso, para trabalhar, ter dinheiro e depois simplesmente dissipar como um vapor. Acho que a vida tem um outro sabor de que precisamos experimentar. E frequentemente existem pessoas morrendo e cada vez mais vivendo a felicidade trágica da vida, lutando por tudo, mas também por nada. Esquecem-se de celebrar o amor que reside na natureza humana. Eu gostaria de ter sido um pai melhor para ti e para as tuas irmãs. Mas não sou. Gostaria de ter sido um filho melhor para os meus pais, mas eu não fui, porque fui infectado por esse câncer social. A questão não é ter, mas sim ser, porque de nada vale o ter, se eu não for uma pessoa que semeia amor. Foi assim que naquele dia eu tomei uma decisão, eu vou procurar o sentido da minha vida. Ou encontro, ou morro procurando. E aí, naquele dia, seu avô disse-me a frase mais linda de um filósofo. Filho, demora o tempo que precisar para descobrir o que amas fazer na vida. Mas quando o encontrares, não desistas, não voltes para trás. E foi assim que percebi que essa vida programada, só traz angústia e depressão. Meu filho, não cresças assim, tão rápido. O mundo é tão grande e tu precisas de deixar ele melhor, ainda. A tua presença aqui não pode representar desconforto para as pessoas e nem para ti mesmo, pois o melhor lugar do ser humano não está nas coisas, mas sim no seu interior. A felicidade de uma célula, embora dependa indirectamente do seu meio extra, depende directamente do seu meio intra, pois é aí onde residem todas as suas vivências. Tudo o que você gostaria de que os outros lhe fizessem, o faça. Faça com amor sem esperar nada em troca. Somente faça. Considere um dia ganho, se porventura tiver alegrado o coração de alguém. Considere um dia ganho, se tiver declarado amor para as pessoas ao seu redor, porque há um poder em “eu amo-te” do que em “eu odeio-te”. As suas palavras podem aumentar um segundo a mais ao metabolismo celular tanto quanto diminuir as chances de vida. Se Deus regista os nossos pecados, então creia que ele também regista as tuas boas ações. E tu não precisas de que alguém reconheça com gratidão o bem que estás a fazer. Sê apenas tu mesmo, mas fazendo coisas boas. Deixar o mundo melhor é a missão de qualquer ser humano. E eu não julgo a tua atitude em relação ao Pedro, teu amigo, mas eu a reprovo. O “olho por olho e dente por dente” não é a melhor opção. Na escola da vida, as expectativas no amor devem ser previamente analisadas, antes que surja uma decepção.

– Mas pai, eu amava-a. – Disse o Batinho.

– Amava-la? O quê?! E agora já não a amas mais? Ela deixou de ser aquela miúda bonita por quem tu te apaixonaste? – Pai, ela traiu-me com meu melhor amigo. Eu não posso perdoar isso.

– Eu sei, eu sei filho. – Disse, calmamente, o Sr. Rafael. – Filho, o amor é uma escolha. E não um mero sentimento. O amor é consciente. Ele passa pelo processo mental. Tu escolhes amar e na mesma proporção escolhes não amar. Tu não podes simplesmente dizer que já não a amas mais. Isso significaria que nunca a amaste de verdade. Tu precisas de escolher amá-la independentemente… Tu acreditas que Jesus nos ama?

– Mais ou menos, pai, mas digamos que sim. – Respondeu Batinho.

– Bem, Jesus é filho de Deus e ele desceu dos céus para amar a humanidade e salvá-la. Pense comigo. Que Deus interesseiro teríamos nós, se por acaso ele deixasse de nos amar logo no primeiro momento em que pecámos? Se o salário do pecado é a morte, logo não haveria um homem sequer a habitar na terra. Mas acontece que ele nos ama e, misericordiosamente, não nos condena, não nos dedura por falharmos, mas sim ele libera e delibera diariamente uma chance para fazermos tudo de novo, de novo e de novo. Sabes do por quê? Porque ele escolheu amar-nos independentemente da nossa resposta a esse amor. O amor de Deus é imutável.

– Mas, Pai, isso só pode ser uma filosofia de vida. – Disse o Batinho. Como o senhor viveria, como seria a atitude do senhor, se mamãe o traísse? Por favor, pai eu acredito em ti e em tudo o que me disseste. Mas, pai, eu não poderia viver com a idéia de estar a partilhar o corpo da minha namorada com outro tipo. Definitivamente isto é o cúmulo.

– Filho, eu amo-te e quero que saibas disso. Eu amo-te. Depois de Deus, tu, as tuas duas irmãs, a tua mãe, são o melhor que eu já tive na minha vida, ou melhor, sois o meu tesouro. E quero levar-vos comigo ao céu, pois o céu é real. O céu existe, porque Deus existe.

–‘Tá bem, pai. Mas diante destas coisas todas, quais são os teus valores ou os valores das tuas crenças?

– Eu tenho valores que eu mesmo penso ter construído. E todos os dias, procuro aperfeiçoar estes valores, porque é escusado o homem ser a mesma pessoa sempre. Alguma coisa tem de mudar. Eu não tenho valores condicionados às vitórias da vida. Eu procuro fazer com que os meus valores sejam mais humanos e menos desumanos, porque neste claustro universal ninguém está livre dos condicionamentos do sistema.

Eu também tive uma infância como tu, participei nas guerras e fui induzido ao machismo, nessa sociedade e, várias vezes e de várias maneiras, a vida colocou-me numa situação de competição. Ou melhor, a vida em si é uma competição entre fortes e fracos, mas eu prefiro estar do lado dos fracos. Eu competi bastante desde os meus catorze anos ou talvez um pouco mais cedo que isso. Quando eu era criança, competíamos eu e os meus amigos, sobre quem podia ter o melhor carro de lata e quem podia facturar mais, vendendo carros de lata e quem podia construir a melhor casa de barro. Na escola, eu já tive as melhores notas. Mas não conseguia perceber a atenção de um professor ao estudante mais assimilado da turma ao invés do não assimilado. Fui visto como o estudante exemplar da minha classe. Eu nunca senti a dor de estar reprovado ou de ir ao recurso. Eu apenas assistia de fora ao que acontecia no palco teatral da vida dos meus colegas e amigos. Eu saboreava a vitória de ser o melhor naquilo que eu fazia, mas baixava o rosto quando via alguém chorar porque não podia ir ao exame final ou então estar simplesmente reprovado. Eu vi que essas pessoas ficavam muito tristes. E eu sentia-me culpado, as vezes, porque para mim, tirar a melhor nota não era assim tão importante. Talvez eu preferiria não ter causado essa dor, não que eu tivesse causado, mas, desde então, comecei a questionar a competição da vida. Porque a gente precisa de ser melhor? O melhor na escola, o melhor na faculdade, o melhor na voz, o melhor, o melhor e o melhor. A sociedade nos rotulou com a idéia de que só as pessoas melhores merecem um lugar melhor. As pessoas recorrem mais a clínicas do que a hospitais públicos, porque se pressupõe que os médicos são mais carinhosos nos hospitais privados e, por vezes, rudes em hospitais públicos. Logo, um hospital privado é melhor do que o público.

– Mas, pai, quando foi exactamente que o senhor começou a ter essa percepção social?

– Foi quando eu fiz Psicologia clínica, em Luanda, há muito tempo.

– A sério, pai? O Sr. também fez medicina?

– Sim, filho, fiz. Era para ser psicólogo clínico, mas por razões fortes às circunstâncias, não terminei. Tive que ir à Rússia para fazer Engenharia de Petróleo e logo depois fiz outra faculdade de Economia e, foi aí onde conheci o tio Nico. Quando eu cursei medicina, tive, a princípio, um baixo rendimento, em outras palavras, eu não era o tipo dos melhores, mas eu tinha o meu lugar. Conheces a Dra. Nídia Vandune? O Dr. Paulo Ney? Foram meus colegas.

– Eu não sabia, pai. Que bom! O senhor é um vencedor. – Filho, eu não venci nada. Eu só fiz o necessário que podia nas circunstâncias em que me encontrava. Que prazer eu tenho, ganhando e correndo mais que os outros? A tristeza de um derrotado não pode valer a minha vitória. Logo, para mim, a vitória perdeu importância. Foi um valor que caiu. Eu não quero ganhar na vida. E eu aplico isso dentro de mim mesmo a idéia de que não quero ser melhor do que ninguém. É que as pessoas lutam tanto para vencer e, se elas não vencem, sentem-se derrotadas e acabadas como se o mundo terminasse, como se já não houvesse mais nada a fazer. E isso é um sentimento horrível. Eu lembro quando eu tive sete valores a Biologia celular na faculdade. Eu senti-me péssimo, derrotado, acabado. E mais, eu senti-me desfavorável. As pessoas podiam-me dizer: Rafael, tenha fé, tudo vai correr bem, mas a grande questão é que eu não acreditava em mim. E isso foi corroendo os meus pensamentos e o pináculo do coração. E hoje eu aprendi que a alegria da vitória é uma falsa alegria, porque ela está edificada em cima de tristezas e não em Deus. Eu ganhei paz ao colocar Deus no centro da minha vida. E isso não é uma tarefa difícil de se fazer.

– Consegues ver o mercado da baixa lá adiante?

– Sim, pai, consigo vê-lo. – Respondeu Batinho.

– Eu já vendi livros naquele mercado e andei por essa cidade conhecendo cada canto e lugar. Era um desafio e tanto porque eu queria vencer na vida. A razão tenta convencer-me desde criança que eu tenho de vencer na vida, mas desde a faculdade de medicina que os meus sentimentos vêm-me dizendo que isso não é verdade. Eu não tenho que vencer na vida. Eu tenho de viver a vida. Aproveitando o melhor que tenho e que pode acontecer; cada segundo, cada milímetro de distância entre eles, é uma oportunidade para viver o melhor que pode acontecer na vida. E hoje eu tenho vocês. Hoje eu tenho uma família. E dizia um amigo meu e colega: paraplégico, na verdade, é aquele que não consegue se mover em direcção ao seu irmão para dar um abraço. Cego é quem não vê seu irmão morrendo de fome e frio. Surdo é quem não gasta tempo para ouvir o desabafo de um irmão, de um amigo. Anão é aquele que não deixa o amor e o perdão crescerem dentro do coração e diabético é aquele que não sabe ser dócil, amável e carinhoso com as pessoas ao seu redor, apesar da diferença. Louco é aquele que não consegue ser feliz com o necessário que possui e o pior, miserável não é aquele que não tem nada a oferecer, mas sim aquele que não acredita em Deus.”

– Então, qual é a sua decisão, filho? Lutar contra a vida para ser um vencedor? Ganhar um troféu, uma briga, uma discussão? E depois?

– Abrace a cruz ao invés da Igreja. Abrace Cristo ao invés da religião. Seja você, seja Cristo e vença para sempre. Houve um silêncio total que aplacou as emoções, Batinho começou a chorar. As palavras do seu pai afloraram os seus sentimentos e o seu rosto virou um lago de lágrimas.

– Perdoa-me, pai. Disse o Batinho.

– Perdoar porque, meu filho?

– Por não ter sido um filho melhor para o senhor. Por lhe causar vergonha e tristeza. Por favor, pai.

– Eu perdoo, sim, filho. Tu tens sido o melhor que eu tenho. Eu tenho orgulho de ser teu pai. Vem cá e dá-me um abraço.

O senhor Rafael beijou e abraçou o seu filho Batinho e ambos agradeceram a Deus por aquele momento e os dois sentiram-se mais desafiados a amar. O tempo passou rápido que já era a hora de buscar o Nico no hotel para o jantar em casa da família Rafael. Os dois entraram no carro e foram para o hotel Roma, onde estava hospedado o Nico.

Havia funge, arroz, calulú, feijoada, usse, mas também havia cabidela no caso do Nico querer comer uma carne. Tudo estava a posto e o Nico já lá estava hospedado na sala de estar a conversar com os filhos do Sr. Rafael e a apreciarem o jogo entre o Barcelona e o Real Madrid. O sorriso desenhado no Nico era resultado da vitória do Barcelona contra o Real Madrid. Enfim, o jantar estava posto e era a hora de jantar.

– Tio Nico, papai, o jantar está pronto. – Disse a Tetinha.

– Está bem, princesa, já aí vamos. Respondeu o Nico. Deram as mãos uns aos outros ao redor da mesa e, desta vez, quem agradeceu pela refeição foi a cassula.

– Senhor Jesus, Te agradecemos pela vida do tio Nico e pela oportunidade que o Senhor nos deu de o havermos conhecido hoje, obrigado pela refeição que é uma benção para nós. Fique connosco e com os mais necessitados, em nome de Jesus. Amém.

– Amém. – Responderam todos.

Saborearam o jantar e todos estavam satisfeitos.

– Vamos subir para ver a vista e tomar um café. – Disse o Sr. Rafael ao Nico.

– Ok. está bem.

Quando os dois estavam na varanda de cima, podia ver-se o bairro e as estradas dos bairros.

– Obrigado, pelo jantar, obrigado pelo convite. A tua família é super educada e com certeza seria um motivo para formar a minha também.

– Eu agradeço a apreciação, mas eu não estou a fazer nada de mais do que alguém no meu lugar não faria. Mas obrigado. Disse o Sr. Rafael e acrescentou: em relação à proposta, eu estive analisando e eu vou fechar o negócio Nico pois, eu creio que essa é uma oportunidade que talvez eu não teria sem você. Creio ser a hora de me tornar um accionista numa companhia petrolífera e quanto aos riscos, estou consciente dos mesmos, mas, ainda assim, eu vou arriscar e viver a vida.

– És um homem de sucesso, porque tu és um homem decidido e sempre preparado para novos desafios. Acredita, Rafael, és um homem paradigmático para muita gente e para mim também. E acredita que esse é um bom negócio, amigo, e vai lucrar muito, podes crer. – Disse o Nico.

– Assim espero, Engenheiro. O Batinho ainda não sabe de que eu não sou o pai dele, mas eu quero fazer esse negócio e deixar as acções em nome dele, pois eu quero ser homem suficiente para deixar os meus filhos economicamente tranquilos.

– Vocês não contaram para o menino a verdade? A Esmeralda concordou?

– Eu e ela tentamos, mas não estamos a ter forças suficientes para esclarecer ao rapaz o que realmente aconteceu e como ela olharia para a sua mãe? Eu não quero trazer mais dor para a Esmeralda.

– Eu entendo, mas algum dia ele terá de saber e fiquem preparados para esse dia. E como você sobreviveu, a essa situação?

– Eu estou vivo, isso é o que importa. E amo a minha esposa independentemente de quem ela era, fez ou terá feito. Eu amo-a. Eu casei com ela e devo ficar com ela. Ela queria sair de casa, quando isso aconteceu, mas eu pedi a ela que ficasse. Ela chorou muito, na época, mas eu insisti que ficasse, porque foi ela a mulher que escolhi para casar. As pessoas erram e nenhum erro humano justifica o outro erro por conta de ser maior que o outro e assim, é o pecado. Não existe pecado maior ou menor e todos nós pecamos diante de Deus; ao invés de julgar e menosprezar o pecado do outro, melhor seria se ajudássemos a levantar o caído, confortá-lo e apoiá-lo. Ela é minha esposa e a minha maior missão é amá-la e não repontar os seus erros. É cuidar para que ela e outros membros da família estejam na bendita graça e misericórdia do Senhor. A única pessoa com quem eu devo brigar é o eu que vive dentro de mim mesmo.

– Mulheres, mulheres, mulheres. – Disse o Nico.

– Eu admiro-te, campeão e podes crer que se houvesse um motivo para ser cristão, eu seria. Disse o Nico, ironicamente.

– Ho! Nico. – Respondeu o Sr. Rafael. O Cristianismo é um estilo de vida. Tu escolhes ser cristão e isso está longe de qualquer sentimento. Escolhes e pronto. O que vem daí em diante é resultado de um relacionamento diário com Deus. Já não é da tua responsabilidade dirigir a vida, mas sim Dele. Ele é que deve fazer as melhores escolhas e decisões em tua vida, mesmo que as mesmas te tragam algum desconforto. Qual é a tua religião, Nico? Pois eu lembro de quando nos conhecemos na Rússia, tu frequentavas a Igreja. O que aconteceu?

O Nico sorriu e disse:

– Eu não tenho religião. A minha religião é a espiritualidade do ser sarcástico.

– Como assim? Desmistifique a premissa deste silogismo filosoficamente abstracto. – Disse o Sr. Rafael.

– Acontece que vocês religiosos estão escusados de ter dúvidas. Para vocês, a crença pela fé é uma certeza absoluta. Ao contrário de vocês, eu não tenho fé, mas sim uma paixão pela dúvida de tudo o que me desafia e isso é que me faz ir atrás das coisas para acabar com a dúvida que abraça os meus ideais e sonhos. Na vossa ideologia religiosa, tudo é baseado na fé e no sacrifício do pouco ou nada que alguém possui para alcançar a realidade do sonho desejado. Vocês acorrentam e abusam da fragilidade intelectual das pessoas para impor os vossos ideais egoístas. Por isso, eu não aceito ser manipulado por um intelectual como eu, ainda mais com essa idéia de religião. Por exemplo, tu bem sabes que eu era religioso e a minha religiosidade estava assente no Cristianismo e eu defendia veementemente essa crença e duma coisa eu sei, a pessoa é psicologicamente exigida a acreditar na possibilidade de uma vida pós-morte e por isso, ela cobra de si mesmo aquilo que vocês chamam de perfeição e eu acho isso estranho. Para mim, isso não passa de um aprisionamento da espiritualidade, dizer que se tal pessoa não fizer tal coisa, ela está em pecado e vai ser punida por Deus. Para mim, isso não passa de uma simples expectativa e de um mero conto de fadas que merece um julgamento a colarinho branco.


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