Текст книги "Um Julgamento de Contos de Fadas a Colarinho Branco"
Автор книги: Marcos Sassungo
Жанр: Современная зарубежная литература, Современная проза
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Ela começou a chorar e de joelhos, disse:
– Quem és tu, Rafael? Que homem é esse que depois de descobrir uma traição, ainda decide estar com a pessoa? Não pode ser eu e não acredito. Por favor, Rafael, não sejas burro. Eu vou entender se fores embora, se me abandonares. Estou a dizer-te, querido, tu podes ir. É seu direito exclusivo.
Naquele momento, quase que me ia embora, mas levantei ela, limpei as suas lágrimas, abracei-a forte e sussurrei no seu ouvido:
– Eu amo-te e nada me faria mais feliz do que viver o resto da minha vida contigo.
– Eu aceito, sim. Aonde fores, eu também irei. O teu Deus será o meu Deus. Disse a Esmeralda, chorando sem parar.
Enfim, mudamos de cidade. De repente, fui acordado das minhas lembranças pelo meu filho.
– Pai, pai, pai, pai… Pai, você está dormindo? Pai…
Era o Batinho.
– Meu Deus! Filho, como estás, campeão?
– Estou bem, pai. Mas olha que o jantar está pronto e a mamã manda chamar. Ela exigiu que trouxesse de volta o seu amor à mesa.
– Está bem, filho, eu vou indo. Vou lavar o rosto e vou ter convosco.
Fui ao banheiro, lavei o rosto e enxuguei-o com a toalha. Mas na minha mente, perguntas do passado procuram respostas no presente. No espelho, o reflexo de um homem com uma história atordoada. O silêncio da confissão perturbou-me, naquela noite. Enfim, tive de sair no palco das minhas lembranças e atender a chamada da minha esposa.
– Pai, na escola pediram duzentos Kwanzas.
– Peça a sua mãe. Amor, Duzentos kwanzas para a Tetinha, por favor.
– Está bem, querido. Depois do jantar, faça-me lembrar, filha.
– Está bem, mãe. – Respondeu a Tetinha.
– E tu, Batinho, como vão as aulas. – Perguntou o Sr. Rafael.
– Bem, vão bem, apesar dos pesares. Na disciplina de Português, estamos a estudar o livro de Vergílio Ferreira “Aparição” junto com o Tino, mas ele está a fazer físicas e biológicas e eu estou a fazer humanas.
– E é difícil? – Perguntou o Sr. Rafael.
– Muito, pai. Temos de fazer o resumo de cada capítulo, analisá-lo, tirar as palavras difíceis, fazer interpretação do texto, ver o sentido morfológico e etimológico das palavras, além de rever sintaticamente o sentido das frases e isso, sem falar da representação em teatro. – Respondeu Batinho.
– Mas, pai quando é que vou começar a estudar? – Perguntou a pequena Daisy, sorrindo.
– Já, já, o próximo ano, querida, só mais um pouco e tu vais estar na escola 142.
– Pai, ela já reservou cadernos para estudar e está a pedir à mãe que lhe compre uma bolsa. – Disse a Tetinha.
– A sério? Essa é minha princesa. Amor, compra uma bolsa para a cassula?
– Está bem, querido. Na terça-feira vou comprar uma. – Disse a Dona Esmeralda.
Numa sexta-feira, pela tarde, o Sr. Gabriel Rocha havia sido convidado de volta para palestrar, na cidade do Huambo e, desta vez, uma conversa aberta com os convidados, na Ekuku, um dos restaurantes geridos pela Centro de Convenção Batista, naquela cidade. Havia músicas, poesias, teatro e humor. E o mais importante: estava lá o pastor e palestrante Gabriel Rocha. “A noite do Cachorro Quente” foi o nome do programa que juntou os jovens da convenção Batista e não só e, apesar do programa ser chamado de “A noite do Cachorro Quente”, a Sandes a cavalo com dois ovos fazia parte da constelação de sabor oferecido aos convidados.
O evento estava lotado e havia jovens de todos os lugares. Tino, Marquitos, Batinho, o Mussungo e o dos Versos estavam sentados juntos e perto deles estava a mesa do palestrante. O ambiente descreveu alegria no rosto de cada jovem e a Tetinha, irmã de Batinho, juntamente com as amigas estavam sentados do outro lado e foi naquele dia em que Marquitos conheceu a Hosana.
– Sejam todos bem-vindos à noite do “Cachorro Quente”, um programa especial dirigido aos jovens e com a finalidade de educar e informar aos jovens da necessidade de nos aproximarmos cada vez mais de Deus e de Jesus. O programa acontece uma vez em cada semestre e quando acontece, convidamos escritores, pastores, filósofos, psicólogos, historiadores e sociólogos, a fim de nos brindarem com as suas experiências do saber. Já cá esteve o escritor Vitor Hugo Mendes. E hoje o Cachorro Quente é especial, pois, apesar das dificuldades, conseguimos trazer, desta vez, no nosso programa, o nosso amigo Pastor Gabriel Rocha, escritor e palestrante internacional. O nosso amigo pastor é licenciado em filosofia e com uma pós-graduação em teologia. Já viajou em vários lugares do mundo e hoje, mais uma vez, está na nossa cidade e em especial aqui, connosco. Ele vai falar sobre família e depois vai falar sobre Fidelidade na visão antropocêntrica. Então, você que é jovem, casado, ou não, namorando ou não, esta é a oportunidade que todos nós temos para ouvir e levar connosco a experiência, que hoje vai ser redigida nas páginas do teatro das nossas vidas. Minhas Senhoras e Meus Senhores, convosco Gabriel Rocha.
A platéia aplaudiu num ambiente de assobios à moda jovem.
– Boa noite, malta.
– Boa noite, Pastor. – Respondeu a Platéia.
O palestrante, segurando a Bíblia na sua mão direita, e o microfone na esquerda, aproximou-se da platéia e começou a dizer:
– Durante muito tempo, eu tenho viajado por todo país, em Moçambique, e tenho-me encontrado com pessoas maravilhosas. Mas vocês, com certeza, deixam-me muito mais maravilhado com essa platéia jovem e feliz. Já estive em Guiné Bissau, África do Sul, Camarões e, no mês passado, estive no Brasil. Foi óptimo estar em cada um destes lugares. Conheci pessoas, autografei livros, abracei leitores, tomei café com amigos, mas hoje é um dia especial, porque é o dia em que eu me faço presente aqui e como se não bastasse, estou diante de uma platéia jovem e esperançosa. A juventude é o sol da esperança de qualquer estado e eu lembro ainda quando jovem, tinha muitos sonhos e eu queria realizá-los. Um deles era o de cursar teologia, enquanto me formava em filosofia na Itália e naquela altura, eu tinha várias dificuldades, inclusive a de custear os meus estudos e logo eu não podia cursar teologia. Eu estudei numa época em que Moçambique enfrentava uma crise económica séria e todas as formas de envio de moedas estavam canceladas e eu vivi desanimado. Dois meses depois, soube de que dois amigos desistiram e tiveram que voltar para o país e eu estava quase a tomar a mesma decisão, ou melhor, quase tomei a decisão. Mas eu fechei os olhos, imaginei-me sendo um pastor e, quando abri de volta, eu vi os meus limites financeiros em conquistar aquela imagem que estava a banhar em minha mente. Eu vou continuar, não importa o que acontecer. Disse eu. Resumindo, eu hoje sou uma pessoa feliz, porque há quinze anos eu tomei a decisão de ser o que eu sou hoje. Apenas uma decisão. E ela mudou toda a minha vida. As decisões que vocês tomarem hoje em relação à vossa vida profissional e afetiva mudará significativamente.
O Sr. Gabriel deu dois passos em frente, olhou a fundo a platéia e disse:
– A primeira agência socializadora do homem é indubitavelmente a família. Por quê? Porque é a família que transmite um conjunto de características, um conjunto de heranças biológicas, psicológicas, sociais e, muitas vezes, espirituais aos membros que compõem a mesma família. É na família, é dentro da família onde a construção de valores éticos, morais e espirituais se consolida na construção de um carácter. É a família que consubstancia o nó de um rio de civilização humana e aquilo que eu sou, aquilo que represento, aquilo que tu és e representas é, muitas vezes, o resultado de quase tudo o que herdamos das nossas famílias. Por isso, eu pergunto a ti, como vai a tua família? E o que tens de melhor na vida, depois de Deus? Se for, a família, então tu tens a melhor coisa no palco da vida. Mas se não for a família, eu quero convidar-te a rever os teus interesses e afectos em relação à família. Sabem do por quê? Porque a família não tem preço, mas sim apreço. A família é um lugar teológico e de terapia de amor onde Deus se revela todos os dias. Em outras palavras, a família é o nosso maior tesouro. Mas, quero hoje transmitir uma mensagem a vocês jovens.
A platéia aplaudiu.
– Como vocês mulheres lidam com os amigos? Quando eu estava cursando filosofia na Itália, tinha uma amiga com quem eu conversava sobre tudo. E quando eu falo sobre tudo, eu quero dizer sobre qualquer assunto mesmo, pois afinal de contas, somos amigos e os amigos partilham tudo: momentos, histórias, alegrias e tristezas. Mas a nossa amizade ficou tão íntima que por vezes eu achava que fosse já um namorado e, com isso, percebi de que ela dava menos atenção ao seu namorado, relevando mais a nossa amizade do que aquela que existia entre eles. Eu conhecia o rapaz, mas eu não era amigo dele.
Entretanto, eu e ela conversávamos longamente e, eu podia ligar-lhe a qualquer hora. Não é mal ser amigo de uma mulher que está num relacionamento, mas a verdade por detrás da história é que atender demasiadamente alguém do sexo oposto, ser amicíssimo ou o best, a uma dada altura pode desencadear substâncias como a endorfina ou a endomorfina, a dopamina e a oxitocina principalmente, que fisiologicamente são vistos como hormónios dos vínculos emocionais e conhecidos também como hormónios do abraço e da felicidade. Porque traduzem um sentimento de felicidade, de tal maneira que, se alguém dentro da relação deixar de ligar, atender ou mesmo deixar de falar com a pessoa envolvida na relação, traduz na pessoa afectada um sentimento ou um estado de depressão. Nas relações humanas, a oxitocina tem uma posição de liderança maior e é vista como um composto cerebral importante na construção da confiança, o que é extremamente importante no desenvolvimento da emoção e do afecto e, quando somos valorizados e estimados por alguém, isso faz sentir-nos diferentes e com uma auto-estima maior.
E naquela altura, dizia o palestrante, eu elogiava-a, porque eu via o valor que ela tinha, ao contrário do seu namorado. Eu creio que ela o amava, ou melhor, os dois amavam-se, mas a minha presença, atenção e carinho começou a confundir os sentimentos dela em relação ao namorado. Para ela, eu era o perfect man e a verdade é que eu não a amava, mas sentia um certo carinho especial. Eu abraçava-a com ternura e quando, chorasse eu consolava-a, levava-a para abraçar a distração no parque e para alimentar a adrenalina, subíamos a montanha russa, eu assistia ao sorriso dela por perto e isso movia em mim um carinho especial cada vez maior. E por mim, estava claro que seu namorado não era realmente seu namorado; quando estamos numa relação e criamos uma conexão emocional com uma outra pessoa, a nossa verdadeira relação pode enfraquecer. Você deixaria hoje em dia sua namorada com o melhor amigo dela em sua casa?
A platéia murmurou e quase metade respondeu: não.
– Pois bem, eu fiz essa pergunta para dez colegas há um ano e a resposta foi surpreendente: não. Eu não deixaria isso acontecer de maneira nenhum, Gabriel. Bem, a questão em causa não é deixar a minha namorada com o meu melhor amigo, mas sim a confiança investida aos dois. Será que eu confiaria na minha esposa ou no meu esposo ao deixá-la com um amigo, irmão ou primo? Hoje a sociedade vive a cólera do medo. Temos medo de tudo. Medo de perder o emprego, medo de reprovar na faculdade, medo de perder a namorada. Medo e medo. Eu percebo que nunca sentimos tanto medo das coisas quanto hoje. Um dia, ao sair de Moçambique para o Brasil, o homem que se sentou ao lado, reconhece. – me e disse: és realmente o Gabriel Rocha, o autor de “Avenidas da Alma”?
E eu disse: sim, sou. E ele disse: eu li o teu livro e tenho um respeito por ti, pela vida e sucesso que tens. Estás sempre em algum lugar do mundo. Mas a tua esposa nunca te traiu?
A platéia riu-se do sarcasmo.
– E aí eu disse: eu confio em Deus, eu confio na minha esposa.
Aí ele me disse: como assim, pastor?
– Bem, confiando. Disse eu e acresci. Se todos os relacionamentos tivessem como base a confiança em Deus, não teríamos tantas infidelidades e decepções. Eu tenho de ter medo de trair Deus e não a minha esposa. Eu tenho de ter vergonha de desonrar e magoar o coração de Deus e não o da minha esposa. A minha mulher é o primeiro ministério que eu tenho no mundo e na vida. A minha missão é amá-la independente e incondicionalmente, pois é fácil amar quem nos ama, difícil é continuar a amar quem não nos ama e o que teríamos em troca, se Deus amasse apenas as pessoas que O amam?
Aí, ele disse: entendi, pastor, entendi. Obrigado.
– Mas muitas vezes, privamos a afeição que é um direito exclusivo do nosso namorado ou namorada, mas há uma grande questão a levantar: vale a pena ficar com um amigo ou amiga por conta do namorado ou namorada não dar atenção necessária no relacionamento?
A platéia ficou em silêncio.
– A Bíblia conta a história de um homem, Elias. Ele era, naquela altura, visto como o homem de Deus e uma mulher famosa e rica reconheceu Elias e hospedou-o em sua casa. Isso aconteceu várias vezes até que ela falou com o seu marido que já era de idade avançada, para arrumar um quarto especial para ele e o seu marido concordou em fazer tal coisa. Apesar de tudo, Elias não se aproveitou da fragilidade emocional daquela mulher nem da bondade do seu marido. Será que hoje em dia teríamos a coragem de hospedar alguém em nossa casa por muito tempo? O medo não é carácter, mas sim uma prisão de carácter.
O palestrante terminou e saiu do palco e a plateia aplaudiu o apresentador do programa, que chegou e disse:
– Eu sei que vocês têm muitas perguntas a fazer, mas o tempo infelizmente acabou. Mas podem entrar em contacto com o nosso palestrante a qualquer hora, amanhã porque ele ainda estará connosco, neste final de semana. Mais uma vez, obrigado pelo carinho. A noite vai continuar com música e teatro, temos ainda muito a oferecer hoje.
– Eu vou deixar-vos, tenho de atender a Santa. – Disse o Tino.
– A Santa?
– Sim, Batinho, a Santa. Eu combinei de me encontrar com ela em sua casa.
– Ok, Tino sem makas, depois te ligo. Eu e o pessoal vamos aproveitar a noite.
– Valeu e aproveitem a noite.
Naquela noite, o Tino deixou os seus amigos e foi ter com a Santa.
– Tino, precisamos de conversar. – Disse ela.
– Eu sei, Santa, estou aqui.
– Olha, eu não sei como dizer isso, mas tu sabes que apesar de tudo, eu gosto de outra pessoa e infelizmente não posso corresponder aos teus sentimentos. Eu sei que és uma óptima pessoa e mereces alguém que goste de ti de verdade e bem do jeito que és. A sério, eu sinto muito.
– Eu entendo, querida. Respondeu o Tino.
– Por toda situação que aconteceu, infelizmente não posso fazer nada para fazer o contrário.
– Só tenho que agradecer o teu honesto argumento e desejar felicidades a ti.
– Então, aceitas numa boa?
– Claro, eu aceito numa boa. Sem reservas eu desejo o melhor para ti. Eu tenho que ser sincero que, apesar de tudo, também não estava a sentir-me feliz nesse relacionamento. O melhor é, de certeza, dar um jeito. Eu vou seguir em frente.
– Olha, muito obrigado por entenderes, Tino, eu realmente agradeço. – Disse ela.
– Não tens porque agradecer, Santa eu acho isso super normal.
Depois daquele dia, o tempo passou e não mais voltaram a verse como antes.
Na semana seguinte, naquele dia de quarta-feira, os homens estavam bem vestidos e as mulheres também. Era aula de Grego e todos devem estar bem apresentados. – Dizia o professor, o Pe. Graciano.
– Estás preparado para prova, Tino? – Perguntou o Marcos.
– Bem, mais ou menos. Mas melhor mesmo é fazer e depois ver o resultado. E tu? Sentes-te preparado?
– Sim, estou. – Respondeu o Capela.
E enquanto eles conversavam, o professor chegou e todos puseram-se em pé e saudaram-no.
– Todas as pastas aqui, em frente, só fica sobre a escrivaninha a esferográfica e a folha de prova. – Disse o professor e acrescentou: não vos preocupeis, hoje a prova está fácil. As perguntas, como vedes, estão no quadro e as duas primeiras perguntas, são para as traduzirem e a segunda é para declinar os substantivos. É tudo e boa sorte!
Após duas horas e meia, seguiria a aula de Língua Portuguesa, mas os estudantes queriam um esclarecimento da frase antes posta no enunciado da prova e também escrita no quadro.E depois de várias tentativas, finalmente a aula terminou.
O anfropos micros estim. O homem é um pequeno mundo ou o homem é pequeno no mundo. O que o professor tem a dizer-nos? – Perguntou o Angelino.
– Bem, essa frase, como pudestes traduzir, pressupõe a posição do homem no universo. Ela introduz a fraqueza do homem diante de um universo como também releva a sua grandeza num espaço onde ele mesmo é governante do seu próprio eu, dono do seu próprio desejo e destino. O homem é um pequeno mundo. Outrossim, a frase é um alarme que levanta as nossas atenções na necessidade de reconstruir o pequeno mundo que representa o homem e, não importa o desastre da vida, o homem é um pequeno mundo onde a paz é e deve ser original.
Tendo dito isso, o professor retirou-se da turma e todos aguardavam pela aula de português.
– Eu estive ontem numa programação na Ekuku… tu não imaginas. Foi óptimo, Capela.
– A sério? Não convidaste por quê, Tino?
– Eu também fui convidado pelo Batinho e não podia fazer nada e essa foi a melhor parte, mas a pior parte foi quando eu conversei com a Santa.
– Você conversou com a Santa? E sobre o que vocês falaram? Conta-me. Pediu o Capela.
– Eu conversei com ela, mas sabes, a conversa foi aquela mesma que tivemos já na vez passada. Ela disse que não poderia entrar num relacionamento por conta de ela gostar de outra pessoa e eu aceitei numa boa.
– Irmão, só posso desejar-lhe força e continue firme. Não desista, ainda há outras por aí e por falar em aí, aí vem a professora de português.
A professora entrou na turma.
– Bom dia, turma.
– Bom dia, senhora professora. – Respondeu a turma.
– Todos de pé, vamos pedir a benção. Ave Maria…
– Cheia de graça o Senhor é convosco. Bendita sois vós entre as mulheres, bendito é o fruto do vosso ventre, Jesus. Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós, amém. – Respondeu a turma.
– Podem sentar-se. Bem, durante o semestre temos vindo a estudar “Aparição” de Vergílio Ferreira e nisto vimos que o ritmo alucinante dos pensamentos, a criatividade das descrições e o uso maravilhosamente excessivo de recursos estilísticos na transmissão de emoções tornaram-se, para nós, marcos gritantes da escrita de Vergílio Ferreira, que neste Aparição se exalta ao mais alto nível.
Portanto não é um livro fácil de degustar, os momentos surpreendentes no livro são frequentes e o cariz existencialista exige um determinado estado de espírito para nos deixarmos envolver. Eu deixei-vos como tarefa fazer um resumo do quinto capítulo. Quem apresentar o resumo oralmente e literariamente estruturado, será considerado aprovado na disciplina de Português e quem não conseguir dizer algo que conote autoridade literária no dizer, terá uma nota e para aprovar fará o exame escrito na próxima semana. Portanto, como vos disse na aula passada, hoje é o dia em que vocês mostrariam o resumo oral do nosso livro de leitura obrigatória. Minhas senhoras e meus senhores, estão abertas as apresentações.
A Juelcy levantou as mãos, aproximou-se da professora e numa posição frontal em relação aos colegas, disse o seguinte:
–“Aparição” é um livro de autoria de Vergílio Ferreira, nela há uma narração autodiegética, diegética e heterodiegética. Alfredo é a personagem principal, que narra em constantes analepses a história da sua passagem por Évora, quando se tornou professor no Liceu. Aí conhece a família Moura, e, Sofia a revelar-se pela sua louca rebeldia, Ana pela sua esbelta inteligência e Cristina pela forma mágica de tocar piano. Alfredo, leva-nos pelos seus pensamentos e sentimentos, pelo seu entusiasmo ao ver que o aluno Carolino partilha o seu questionamento permanente em relação à vida, inclusive no momento em que vê o seu grupo de amigos e o mundo à sua volta a ruir. O autor ainda partilha connosco, por meio de Alfredo, um tempo cronológico distribuído em diferentes situações e personagens.
A história é entrecortada por pensamentos do género "quem sou eu?", o corpo e a alma? Deus que é apresentado de forma metafísica, mas não deixa de haver uma causalidade e uma história que acompanhamos. E a lição que eu tiro deste é que quer ser um homem, isso implica ter um propósito, ser consciente, ter liberdade e agir, questionar-se, pensar sobre si mesmo. E a primeira pessoa faz todo o sentido nesta reflexão «sentimental» que o autor leva a cabo, num registo quase autobiográfico. É tudo.
A turma aplaudiu a narração de Juelcy.
– Meus parabéns, filha. Disse a professora e acrescentou: eu tenho uma pergunta. Você falou de um tempo cronológico durante a sua abordagem, entretanto como pode ser dividido o tempo cronológico? Haverá um outro tempo descrito além deste?
– Obrigado pela pergunta, professora. – Respondeu a Juelcy. E, entusiasticamente acresceu: o tempo cronológico pode ser o presente, o passado e o futuro. Logo, os três apresentam-se no livro como testemunhas oculares dos acontecimentos vividos pelos personagens. Outrossim, há um outro tempo. O tempo psicológico. Nele o autor partilha a vivência das suas lembranças. Sento-me aqui, nesta sala vazia, e relembro.
– Podes voltar ao assento. Estás aprovada. – Disse a professora.
– Quem será o próximo? Eis o exemplo da vossa colega. Façam como ela.
O Angelino levantou a mão.
– Sim, Angelino, venha para cá. Leste o quinto capítulo?
– Sim, li, professora. – Respondeu.
– Tudo bem, faz um excerto do quinto capítulo.
Angelino, olhando para a professora e para os seus colegas, respondeu o seguinte:
Excerto número um, Carolino, ao contrário de Chico, revela-se muito interessado nas ideias do narrador e afirma que ele mesmo já tinha feito a experiência do espelho e relativamente à questão do sentir e do ser, já se tinha perguntado o que sente. E esta conversa foi posteriormente discutida em casa de Ana e Alfredo e estando presente Sofia, sendo que as ideias de Alberto suscitaram algum interesse. Na lição presente com Sofia, o narrador descreve um ambiente aconchegante e de intimidade. A beleza de Sofia volta a ser relatada. Perante aquele ambiente, num impulso estimulado por uma provocação de Sofia, o narrador agarra-a sendo que esta o repele. Todavia, Sofia acaba por beijá-lo.
Excerto número dois; depois deste momento, Sofia diz a Alberto que compreende toda a sua ideia acerca da existência. Inclusive Sofia radicaliza a sua existência, por lhe fazer sentido viver de acordo com os impulsos do seu EU que ela reconhece, pois conhece a verdade que Alberto fala. Contudo, esta sobrevalorização da vontade do EU, faz com que Sofia viva de modo cruel, egoísta, ignorando que pode magoar os outros. Por último, Alberto sai de casa de Sofia perturbado e angustiado com a intensidade de sentimentos. É tudo o que eu queria dizer. Obrigado.
– Obrigado, Angelino. Turma, eu só gostaria de tecer algumas considerações em relação ao quinto capítulo e dizer o seguinte: é necessário ter em conta que, na obra, os momentos em que o narrador deambula pela cidade e descreve-a, são intercalados com momentos de reflexão. Segundo, a obra apresenta-se com uma característica simbólica. Lembram no livro a primeira vez que o narrador se envolve com Sofia e como ele a descreve?
– Sim. – Respondeu a turma.
– A descrição do vestido preto, por exemplo, a cor preta, neste caso, pode estar associada à elegância e sofisticação; por outro lado, pode estar associada à ideia da morte, funcionando como um presságio. Terceiro, o discurso desta obra tem carácter introspectivo, reflexivo, em que a personagem principal, Alberto, através da narração da sua história na primeira pessoa, vai reflectir acerca das condições de existência. Assim, a obra “Aparição” é indissociável da filosofia existencialista, sendo na verdade, um ensaio sobre “Aparição”. Alberto efectua a procura pelo seu eu, pela progressiva tomada de consciência de si próprio, numa tentativa de encontrar a sua harmonia interior. Portanto, mais do que uma obra, “Aparição” é um desafio que propõe mudanças de destinos diferentes. E vocês como jovens estão convidados a desafiar o vosso eu dentro do vosso mundo interior. Sejam ousados nas vossas ideias e vivam os momentos amistosos como um presente inalienável.
Uma hora depois de todos os alunos terem apresentado o resumo, ficaram aprovados em Língua portuguesa. E no final da aula, a professora dirigiu-se aos estudantes e disse o seguinte:
– O Centro Pré Universitário Católico, aqui no Huambo, tem a honra de vos apresentar à sociedade como homens e mulheres preparados para enfrentar o mundo a fora. Sejam fortes e corajosos. Não desistam dos vossos sonhos. Continuem desafiando o mundo acadêmico. Vós sois o futuro de Angola. Vós sois o amanhã de Angola. Vós sois o brilho deste país e cada um de vós deve sentir-se como uma peça fundamental na construção de uma Angola melhor, “melhorando o que está bom e corrigindo o que está mal”. Bem haja e boa sorte ao mundo.
A turma aplaudiu alegremente e foi assim que Tino, finalmente terminou o ensino médio no CPUC, na manhã da-quele dia de quarta-feira. Naquele mesmo dia, o Sr. Américo, o pai de Tino, também parabenteou a vitória de seu filho, na presença da sua esposa.
– Meus parabéns, filho. És um orgulho para todos nós.
– Eu sinto-me mais orgulhado ainda de vocês, pai. – Disse o Tino ao Sr. Américo.
– Eu sou grato a ti e à mamãe, por todo o esforço aplicado em mim. Todos os pais são bons, mas vocês são os melhores que eu já tive e sempre terei ao meu lado. Eu amo-vos.
O Sr. Américo abraçou longamente o seu filho e brindou o momento com todos os presentes.
E no dia seguinte, Batinho visitou a Vanda. Era um dia de chuva e havia vento por todo lado e trovões não paravam de gritar, e as ruas alagadas permaneciam inacessíveis.
– Acho que hoje não vais sair. Aposto que não.
– Eu preciso de sair, Vanda. Amanhã tenho aulas pela manhã e não posso faltar no último dia de aula.
– Eu sei, mas a natureza está a pedir que passes cá a noite. Por favor. Eu agradeço que tenhas vindo visitar-me e saber de como estou, depois da morte do meu pai, mas ficaria grata se passasses a noite cá. A minha mãe não se importa, podes crer. Ela está no quarto lá de cima. Vá lá, diz que sim.
– Ummmm, está bem. E você, sabe de que tenho sempre as minhas condições.
– E quais são, dessa vez? – Perguntou a Vanda.
– Desde que os meus pais concordem que eu passe aqui a noite e desde que você me prepare um café.
– Ok, aceito as condições. – Disse a Vanda.
– Está bem, eu vou ligar agora. Ho!
– O que foi?
– O meu celular não tem crédito suficiente. Eu não acredito, eu não mais usarei os serviços da Unitel, só pode ser.
– Haaaa, venha para a Movicel, estará sempre consigo. Faça sol, faça chuva, trovões, vai estar sempre consigo. – Disse ela.
– Você pegou-me de jeito. Tens saldo?
– Pegue o telefone.
– O telefone dele está desligado. – Disse o Batinho.
– Com essa precipitação atmosférica, podes crer que todo mundo desligou o telefone.
– Mas eu vou ficar e, assim que melhorar, eu vou-me, embora.
– Está bem. Olha, eu vou à cozinha pegar algo, já volto. O clímax entre Batinho e Vanda estava a ficar muito diferente quando a Vanda chegou e beijou Batinho.
– Eu amo-te, Batinho.
– Vanda, não podemos fazer isso, por favor.
– Eu sei, mas eu não resisto quando te vejo. Por favor, fica comigo. – Disse ela.
– Está bem,Vanda, eu aceito namorar contigo. Talvez seja a hora de esquecer a Carla.
– Tu trazes-me paz. Tu trazes-me alegria. Tu fazes-me feliz e quero que isso perdure sempre. – Disse a Vanda.
– E eu espero corresponder a esse sentimento e permitir que a felicidade costure nas minhas entranhas o verdadeiro, o amor como o de Camilo Castelo Branco. – Respondeu Batinho. Quando a chuva cessou, o relâmpago apagou, o vento se ausentou e as ruas ainda estavam entupidas de água, mas, ainda assim, Batinho queria sair da presença tentadora da Vanda.
– Já que insistes eu vou levar-te de volta para sua casa. Já já volto, vou pedir a chave do Jeep do meu pai.
– Está bem, vá lá que eu te aguardo aqui. – Disse ele. Vanda levou Bantinho de volta a casa.
Porém, havia uma discussão entre o Sr. Rafael e a dona Esmeralda naquele mesmo dia. Eles discutiam sobre tudo, inclusive sobre o silêncio da confissão.
– Eu já não aguento mais ficar calada, Rafael. Eu não posso mais. É muito tempo. – Disse a dona Esmeralda e acrescentou: Eu não sei o que fazer e acho que já deve ser a hora de contarmos a verdade ao garoto.
– Eu também acho, querida, mas como poderemos fazer isso e onde poderemos fazer?
Perguntou o Sr. Rafael à dona Esmeralda.
– Começámos pelo começo. – Respondeu ela e acrescentou: Não importa onde começamos ou como começamos, a verdade é que precisamos de fazer isso para o bem dele e precisamos de contar o mais brevemente possível, pois é desnecessário o silêncio da confissão nesse momento, por favor, fique comigo. – Disse a Esmeralda.
– Eu estou contigo desde o início e estarei até ao final dessa história contigo. Não te vou deixar sozinha.
E os dois esperaram o Batinho chegar.
– Filho, eu e teu pai queremos falar contigo.
– Está bem, mãe. – Respondeu ele.
– Filho, feche a porta, por favor.
– Sim, pai, o que vocês têm para me contar?
– Bem, filho, primeiro eu quero dizer-te que te amamos muito e independentemente do que acontecer, queremos que saibas que és especial para nós. És o presente mais lindo que já tivemos.
– Mãe, estou a ficar preocupado, deixem de ser misteriosos. O que é que vocês querem dizer-me?
– Eu sou a tua mãe e tu precisas de confiar em mim. Mas acontece que o Rafael não é o teu verdadeiro pai. O teu verdadeiro pai é o Sr. Anderson.
– O quê mãe?! O Sr. Anderson? Que Anderson mãe?
– Filho, tu precisas de te acalmar, por favor. – Disse a Esmeralda.
– Mãe, eu estou calmo, mas, por favor, expliquem-me o que está acontecendo.
– O Sr. Anderson que infelizmente morreu, era o teu pai biológico. Ele era amigo do teu pai, nosso amigo. Mas infelizmente eu fui infiel com o teu pai Rafael e fiquei grávida de ti com o Anderson, teu pai. Na altura, eu já me tinha casado com o Rafael quando descobri que estava grávida, e aí eu queria ficar com ele, mas ele fugiu da responsabilidade e foi assim que o Rafael me deu novamente a oportunidade de estar com ele. Tu cresceste e não queríamos que soubesses que o tio Anderson fosse teu pai. Mas quem cuidou de ti desde bebê, desde a placenta fui eu e teu pai, Rafael.
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